Uma viagem pelos labirintos do cérebro

Quotidiano
Última atualização: 10/08/2022
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Como funciona o cérebro e quais as suas funções? Por que é importante exercitar este órgão? Existem mesmo diferenças entre o cérebro feminino e masculino? E entre destros e canhotos? Conversámos com a neurologista Sofia Oliveira, que nos falou das complexidades deste órgão que comanda as nossas ações.

Qual central de gestão de informação, o cérebro funciona como uma sofisticada estrutura de resolução de problemas. É este sistema de redes neuronais que permite ao nosso organismo interagir com o meio que nos rodeia, ter consciência de nós mesmos, agir de forma adequada e, ao mesmo tempo, armazenar experiência e aprender.

Um verdadeiro processador de informação

“O cérebro é capaz de interpretar os estímulos provenientes do ambiente e de terceiros, sejam eles visuais, táteis, auditivos, olfativos ou sonoros. Estes estímulos são captados por estruturas especializadas, transformados em mensagens elétricas e transportados para o cérebro”, explica a neurologista Sofia Oliveira. O cérebro analisa depois a informação e, depois de a comparar com os seus “arquivos internos” – as suas experiências prévias – atribui a cada uma um valor emocional (bom, mau, perigoso, agradável, etc…). “Feita esta análise, o cérebro decide se é necessária alguma ação motora e dá ordens ao corpo sobre como atuar, permitindo uma resposta apropriada. Ao mesmo tempo, parte desta experiência é memorizada, guardada num sistema de arquivo interno, para ser utilizada no futuro”, explica a especialista.

Todo este processo é feito num ínfimo espaço de tempo e nem sempre temos consciência dele. Na verdade, o cérebro pode atuar sem que o indivíduo tenha consciência do que está a acontecer – é o que chamamos instintos, essenciais à nossa sobrevivência. “Por exemplo, o instinto que temos de retirar a mão de uma superfície extremamente quente antes de nos queimarmos. O cérebro recebe a informação de que está quente, analisa, decide que é perigoso e dá a ordem para retirar a mão sem que o indivíduo tenha tempo de se aperceber do que está a fazer”, exemplifica Sofia Oliveira.

Cérebro feminino vs. cérebro masculino

Desde há séculos que se criou a ideia de que homens e mulheres têm cérebros diferentes. Mas a verdade é que são mais as semelhanças do que as diferenças. “Há fatores genéticos, hormonais e de aprendizagem social implicados na diferença entre homens e mulheres, e necessariamente na forma como o seu cérebro funciona. No entanto, as diferenças são pequenas e provavelmente compensatórias para permitir um desempenho equivalente na maioria das tarefas”, diz Sofia Oliveira, que dá o exemplo das diferenças de tamanho. Na verdade, o cérebro masculino é, em média, 11% maior que o feminino. Contudo, como os homens são 18% mais pesados e 9% mais altos que as mulheres, o tamanho cerebral é, na verdade, equivalente.

“No geral as mulheres parecem ter ligeiramente mais capacidades em tarefas de interação social e comunicação incluindo linguagem, e os homens em tarefas visuoespaciais. Nas mulheres parecem estar mais desenvolvidas algumas áreas como o córtex fronto-orbitário e límbico, essenciais para a regulação de emoções e estabelecimento de relações em sociedade. No entanto, os estudos são contraditórios e pouco robustos”, alerta a neurologista.

Há doenças do foro neurológico e psiquiátrico que são mais frequentes num género do que no outro, podendo algumas estar relacionadas com a função cerebral. “A depressão é mais frequente nas mulheres o que terá seguramente a ver com fatores hormonais e a forma como esses afetam circuitos como o eixo hipotálamo-hipofisário e a nossa resposta ao stress."

Por outro lado, os homens parecem ser mais vulneráveis a dislexia, uma perturbação da linguagem. Os estudos mostram que as mulheres usam os dois hemisférios em funções de linguagem de forma mais equilibrada e os homens não têm essa característica”, explica Sofia Oliveira.

Diferenças entre o cérebro dos destros e dos canhotos

É a localização das estruturas envolvidas no processamento da linguagem que faz a diferença entre destros e canhotos. “Em 90% dos indivíduos destros as principais áreas de linguagem situam-se no hemisfério esquerdo enquanto que nos esquerdinos essas áreas só estão no hemisfério esquerdo em 50% dos indivíduos”, diz Sofia Oliveira. Isto explica que, se houver uma lesão do hemisfério esquerdo, como por exemplo um AVC, quase todos os indivíduos destros possam ter afasia – perturbação da linguagem em que deixam de conseguir falar ou compreender. Já os esquerdinos serão afetados se a lesão ocorrer no hemisfério direito.

Resiliência do cérebro

As capacidades do cérebro não cessam de surpreender os investigadores. Ao contrário do que se pensava previamente, além de ter capacidade de adaptação e aprendizagem, o cérebro consegue também regenerar-se. “Quando há uma lesão, o cérebro não só tenta reparar essa lesão, como pode recrutar outras redes de neurónios para tentar realizar as tarefas perdidas e por vezes consegue-o com extrema eficácia”, afirma Sofia Oliveira. Importa dizer que, quanto mais jovem, mais saudável e mais estimulado for, maior é a capacidade de regeneração e de recuperação. É isto que explica que algumas pessoas recuperem de lesões cerebrais extremamente graves.

Mente sã em corpo são

Tal como mantemos o nosso corpo em forma, exercitando os músculos, é fundamental exercitar o cérebro. Este tem capacidade de aprender e há vários estudos que mostram que o hipocampo – zona do cérebro relacionada com a memória a curto prazo – aumenta de tamanho com o exercício de estudo e memorização. Como refere Sofia Oliveira, “se exercitarmos o nosso cérebro, aumentamos a velocidade a que ele é capaz de realizar essas tarefas e aumentamos a sua eficiência, ou seja, ele precisa de usar menos redes. Com isto aumentamos aquilo a que chamamos a plasticidade cerebral – a capacidade que o cérebro tem de se adaptar e de resistir à doença. Patologias como a diabetes, a hipertensão arterial, consumo de tóxicos como o álcool e o tabaco, provocam lesões cerebrais diminuindo a sua capacidade de funcionamento e a sua plasticidade, tornando-o mais vulnerável e menos eficiente”, elucida a neurologista.

Assim, subjacente à missão de manter um cérebro saudável, é essencial assegurar a saúde global, através de uma alimentação equilibrada e diversificada, da prática de exercício físico e que não inclua hábitos nocivos como o tabagismo e o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, entre outros.

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pelo Conselho Científico da AdvanceCare.

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